quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Tratado sobre Solidão, Agonia, Obsessão e Salmoura

A solidão é produtiva quando planejada;
porém,
quando improvisada
pode ser sinal de fraqueza.

A agonia é positiva,
mas ao insistir em perpetuar-se,
torna-se doença
de cor amarela.

– Há toda uma arte da agonia (ela potencializa a criação), a qual consiste em saber sentir prazer ao agonizar. Entretanto, a agonia apenas tem sentido se for precedida e postulada por uma pequena estabilidade. Quero dizer que não tem sentido algum alguém agonizar perpetuamente.


– A solidão causaria agonia?
– Sim, a sociabilidade é uma tentativa coletiva de não agonizar. Entretanto, temos dois tipos de agonia: 1) agonizar, como conseqüência do jogo agonístico (é aquela da luta eterna entre a cultura e a civilização, Nietzsche); 2) insistir em não agonizar (aquela de cor amarela). Exemplo: amo o calor, mas isso não quer dizer que quero que ele se perpetue (se eu assim quisesse, o caso diria respeito ao segundo tipo). Ao contrário, quero vê-lo esgotar-se, acompanhar a sua intensificação, até que se torne insuportável, diluindo-se em chuva (jogo agonístico).

A obsessão pode ser sinal de seriedade, controle e sobriedade;
mas também pode ser sinal de insegurança.


– Dois tipos de salmoura: o de Flaubert e o da missa. Este é o tipo humilde, o qual nos mantém em segurança justamente porque nada acontece: todos permanecem sendo aqueles que já eram: o aborrecimento surgindo como decorrência da monotonia. O outro tipo, o de Flaubert, é a salmoura indispensável para recomeçar qualquer projeto. Trata-se da desilusão que acontece sempre que uma coisa se realiza: o aborrecimento surgindo como decorrência de uma sensação de insatisfação por algo ter terminado. Sobre isso, Witold diz: "Porque a realização é sempre duvidosa, insuficientemente precisa, privada da grandeza e da pureza do projeto". Evidente, pois o fim do projeto não é redenção, pelo contrário, é salmoura.
Marinade é a palavra que Flaubert pronunciava quando aborrecido chegava ao seu apartamento. Jogava-se no sofá e dizia: "marinade" (que significa: salmoura), e ali permanecia curtindo o seu próprio aborrecimento. Passada essa fase, voltava a produzir.
[Fragmento de minha Tese de Doutorado: "Procedimento Erótico..."]

2 comentários:

N. disse...

Esse texto é teu?

Gabriel Sausen Feil disse...

Sim, trata-se de um fragmento da minha tese de doutorado.